Em Bonn, jovens cobram espaço real nas decisões climáticas: "Estamos prontos"
Jovem campeã do clima da COP30, Marcele Oliveira, cobrou urgência e inclusão efetiva da juventude nas NDCs, durante o SB62. Com apenas 23 países tendo submetido seus novos compromissos climáticos, a reunião na Alemanha reforça o papel estratégico das juventudes no redesenho das metas globais

Por Franciéli Barcellos de Moraes | COP30
Quando o Brasil atualizou sua Contribuição Nacionalmente Determinada (na sigla em inglês, NDC) em novembro passado, um marco silencioso, mas simbólico, foi conquistado: pela primeira vez, o texto faz menção explícita a crianças e jovens. Neste contexto, a CEO da COP30, Ana Toni, e a jovem campeã do clima, Marcele Oliveira, coordenaram nesta quarta-feira, 18/06, em Bonn, na Alemanha, um encontro com jovens lideranças climáticas de diversos países, a fim de escutar e acolher as vozes desta nova geração, que reivindicam participação real no desenho de políticas que moldarão o mundo nas próximas décadas.
Dentre as pautas foco esteve justamente a entrega destas NDCs pelos outros países, já que esse têm sido o principal instrumento para que as nações detalhem suas metas e caminhos para redução das emissões nacionais e para adaptação aos impactos da mudança do clima. Enquanto o mundo corre contra o tempo para alinhar seus compromissos climáticos à meta de 1,5 °C, a juventude deseja deixar de ser espectadora para se tornar protagonista. O encontro aconteceu no escopo da 62ª sessão dos Órgãos Subsidiários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (SB62), evento preparatório para COP30.
"O Brasil não pode agir sozinho. E é por isso que esta é uma luta muito maior. Até então, apenas 23 países submeteram suas novas iniciativas. Precisamos que os demais sigam esse exemplo — e que o façam com urgência"
— MARCELE OLIVEIRA, jovem campeã do clima da COP30
“Precisamos de NDCs qualificadas vindas de todas as Partes, e é por isso que estamos aqui: por uma conversa intergeracional. O Brasil não pode agir sozinho. E é por isso que esta é uma luta muito maior. Até então, apenas 23 países submeteram suas novas iniciativas. Precisamos que os demais sigam esse exemplo — e que o façam com urgência”, destacou Marcele, que ainda versou sobre a problemática de que os planos climáticos estejam sendo desenhados sem quem terá o futuro forjado por tais decisões.
Pela presidência da COP30, Ana Toni apresentou os esforços brasileiros neste sentido, e incentivou as cobranças por parte dos jovens, como fator positivo à celeridade dos processos. “Os governos também estão aprendendo nesse processo. Mas uma coisa posso garantir: se não houver pressão, não funciona. E vocês, jovens, são muito bons nisso — em nos pressionar. Isso é realmente importante”, disse ela, que ainda relembrou o início de seus trabalhos pelo clima na juventude.

O encontro deixou nítido que a pressão por protagonismo juvenil nas políticas climáticas não é nova. Mas que nos últimos anos foi consolidado um movimento que agora busca algo mais do que representatividade simbólica: participação estruturada, financiamento e poder de decisão.
“Engajamento não significa apenas consultas e educação — significa também garantir que indicadores sensíveis à infância sejam monitorados nas futuras NDCs. As ferramentas do Fundo das Nações Unidas para a Infância (na sigla em inglês, UNICEF), entre outras disponíveis, são excelentes pontos de partida para isso. A inclusão significativa de crianças e jovens não é apenas um gesto simbólico. Podemos falar muito sobre isso, mas, na prática, é uma necessidade estratégica”, colocou Leyla Hasanova, jovem campeã do clima da COP29 de Baku.
Foi somente no último ano que esta posição começou a existir, uma conquista dos movimentos de juventude. Além da eleição de Leyla, no Azerbaijão, foi lançado um programa regional de delegados jovens para a COP do último ano, funcionando como um campo de treinamento para compreensão dos processos da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (na sigla em inglês, UNFCCC) e das NDCs. A experiência foi combinada com oficinas nacionais em parceria com o UNICEF e com acampamentos de verão focados na educação climática de jovens educadores, envolvendo representantes de mais de 30 países.
Miriam Castillo, do Fórum Internacional dos Povos Indígenas sobre Mudanças Climáticas (na sigla em inglês, IIYFCC), relembrou a diversidade das juventudes, e frisou como algumas destas — indígenas, rurais, com deficiência e de contextos periféricos — seguem enfrentando barreiras ainda mais complexas à participação nos debates, mesmo que sejam as mais afetadas. Ao encontro da colega do Azerbaijão, Miriam também tratou de questões de institucionalização da participação jovem no tema de clima. “É fundamental estabelecer conselhos permanentes de juventude vinculados à governança das NDCs nos níveis nacional e local, bem como promover a liderança jovem na política climática, garantindo papéis formais para os jovens nas consultas climáticas nacionais e como parte das delegações das Partes nos processos da UNFCCC. Isso é essencial para possibilitar uma participação significativa”, finalizou ela.
Um resumo das recomendações levantadas:
Governança permanente e vinculante, com conselhos de juventude atuando nos níveis nacional e local.
Financiamento estruturado para ações climáticas juvenis.
Materiais acessíveis e traduzidos, com linguagem adequada a diferentes faixas etárias e realidades.
Formação contínua e regionalizada, com foco em capacitação e alfabetização climática.
Inclusão interseccional, respeitando a diversidade de experiências entre os jovens.
Com a chegada da COP30, a expectativa é de que as juventudes estejam presentes em todos os pilares da Conferência: desde os discursos de chefes de Estado até os painéis técnicos e a mobilização popular. Para os jovens presentes no encontro desta quarta-feira, 18/6, se a crise climática exige uma abordagem que contemple toda a sociedade, como indicou o último balanço global da UNFCCC, então não há mais espaço para decisões tomadas a portas fechadas. O recado foi dado: a juventude está pronta.