Desinformação climática no centro da geopolítica: presidência da COP30 lidera articulação global na pauta
Na SB62, Brasil apresenta estratégia internacional para conter a desinformação e fortalecer políticas públicas climáticas. Evento em Bonn, na Alemanha, reuniu autoridades e especialistas em prol de coalizões multissetoriais pela integridade da informação

Por Franciéli Barcellos de Moraes | COP30
A integridade da informação sobre o clima, embora não seja um tema novo, ganhou, nos últimos anos, maiores contornos de complexidade e urgência no cenário geopolítico. Em meio à crescente onda de desinformação que ameaça comprometer o avanço da ação climática global, a presidência da COP30 deu destaque à pauta na agenda da 62ª sessão dos Órgãos Subsidiários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (SB62), em Bonn, na Alemanha. A promoção do evento "Integridade da Informação sobre as Mudanças Climática" detalhou o compromisso da presidência com a promoção de um ecossistema informacional íntegro e confiável, essencial para avançar nas negociações no tema.
A iniciativa teve por objetivo mobilizar os países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) e demais atores globais em torno da importância de garantir um debate público qualificado, baseado em evidências científicas. O encontro, que reuniu pesquisadores, autoridades governamentais e das Nações Unidas, teve por base a Iniciativa Global pela Integridade da Informação sobre Mudanças Climáticas, lançada pelo governo federal do Brasil em parceria com a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), durante a Cúpula do G20 em novembro do último ano.
"O grande problema da desinformação é que ela atrasa a reação, ela faz com que a gente passe a olhar para o lugar errado ou passe a pensar o tema com menos urgência do que ele tem"
— JOÃO BRANT, secretário de Políticas Digitais / Secom PR
“O grande problema da desinformação é que ela atrasa a reação, ela faz com que a gente passe a olhar para o lugar errado ou passe a pensar o tema com menos urgência do que ele tem", apresentou João Brant, secretário de Políticas Digitais da Secretária de Comunicação Social da Presidência da República (Secom PR), que conduziu os trabalho. Ele ainda destacou que desse evento até novembro o processo será de colheita do que já existe e ao mesmo tempo plantio de novas iniciativas.

Nos debates, ressaltou-se que a desinformação compromete políticas públicas e mina soluções baseadas em evidências científicas e que para enfrentar esses desafios, é fundamental ampliar a produção de dados, pesquisas e investigações detalhadas, sem desconsiderar os impactos desproporcionais às populações mais vulneráveis, especialmente no Sul Global. Também foi realçada a necessidade de compreender melhor quem financia essa desinformação no ambiente digital, especialmente a conexão entre publicidade online e essa indústria, bem como a significância de envolver ações em nível nacional, assim como iniciativas multilaterais, regionais, da sociedade civil e da comunidade científica para efetividade.
Charlotte Scaddan, assessora sênior para Integridade da Informação da ONU, frisou que comportamentos de desinformação não são marginais, ao contrário, estão no centro do espaço informacional e são usados por figuras influentes — tanto do Estado quanto da sociedade civil. "Esses agentes de desinformação climática não apenas tentam minar a ação climática, mas também usam o tema para gerar polarização social e desestabilizar processos democráticos, inclusive eleições. Isso impacta diretamente diversas áreas de atuação da ONU", disse.
A CEO da COP30, Ana Toni, endossou a importância da pauta, mas salientou a importância da estima das conquistas na pauta climática até aqui, como a existência do Acordo de Paris. "Se nós mesmos começarmos a duvidar do sistema em que estamos inseridos, e fecharmos o sistema multilateral, isso será exatamente o que a desinformação e a falta de integridade, as fake news, querem: nos isolar e paralisar. Então, acredito que precisamos mostrar claramente os avanços dos últimos dez anos como parte da nossa estratégia. Celebrar isso é essencial", colocou ela.
Caminhos
Para além da apresentação dos desafios, caminhos possíveis para superação do cenário de desinformação também foram discutidos. O foco esteve nos potenciais da atuação conjunta em coalizões. Foi posto que, a longo prazo, é fundamental construir confiança junto às comunidades, adotando abordagens que valorizem as diversidades, o que implica em uma escuta atenta, reconhecendo críticas legítimas e mantendo o diálogo aberto. A mensagem é que diante da complexidade do desafio, fica claro que nenhum ator isolado poderá enfrentá-lo sozinho, e que apenas coalizões multissetoriais podem apontar para uma resposta eficaz.
Enviado especial
Dentre os integrantes da mesa, esteve Frederico Assis, enviado especial para Integridade de informação da COP30. Esta é a primeira vez que este tema ganha tal destaque na agenda da Conferência. "Hoje, os conteúdos manipuladores, conspiratórios ou, simplesmente falsos, são menos sobre as mudanças do clima em si, embora isso ainda exista, mas numa linha de um ceticismo estratégico, ou seja, visando colocar em cheque, as ações para a solução da questão climática", disse ele, que ainda retomou a pertinência da apreciação do tópico pela presidência brasileira de forma transversal.
Os enviados atuam voluntariamente e em caráter pessoal, compondo o quadro de interlocutores para o fluxo de informações e percepções das áreas que representam, o que permitirá que as interações ocorram de forma mais rápida e eficaz. Também serão canais diretos para apresentar demandas e pedidos para a Presidência da COP30, atuando como pontos de contato dos setores.
Iniciativa Global pela Integridade da Informação
A coalizão internacional é aberta a todos, não apenas aos membros do G20, e tem como foco a produção de conhecimento sobre o impacto da desinformação nas ações climáticas, o fortalecimento de campanhas de comunicação sobre mudanças do clima e a promoção da cooperação institucional e internacional para proteger a integridade da informação.