Sexta Carta da Presidência Brasileira
19 de agosto de 2025
Prezadas amigas, prezados amigos,
Avançando nosso Mutirão Global contra a mudança do clima, a Presidência brasileira da 30ª sessão da Conferência das Partes (COP30) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) apresenta sua sexta carta à comunidade internacional – incluindo Partes e atores não Partes – desta vez com foco nos preparativos para a própria COP30.
Nesta carta, refletirei sobre as 62ª sessões do Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico e Tecnológico (SBSTA) e do Órgão Subsidiário de Implementação (SBI) da UNFCCC (SB62), que foram realizadas em Bonn, Alemanha, de 16 a 26 de junho de 2025. Com base no que a Presidência ouviu das Partes em Bonn, apresento abaixo os próximos passos em nosso caminho rumo à COP30.
Na minha terceira carta, convidei os negociadores a se engajarem como co-construtores de uma infraestrutura global de confiança, trabalhando juntos em modo de força-tarefa para garantir progressos significativos na SB62. As sessões de junho em Bonn alcançaram encaminhamentos satisfatórios que podem abrir caminho para resultados bem-sucedidos na COP30, incluindo questões pendentes de negociação relacionadas a (i) indicadores do Objetivo Global de Adaptação (GGA) no âmbito do Programa de Trabalho Emirados Árabes Unidos-Belém, (ii) o Diálogo sobre a implementação dos resultados do Balanço Global (GST) e (iii) o Programa de Trabalho sobre Transição Justa (JTWP).
A Presidência da COP30 aprecia profundamente a liderança inestimável da Presidência da COP29 e dos presidentes dos Órgãos Subsidiários (SBs), sem os quais o progresso alcançado em Bonn não teria sido possível. Sinto-me privilegiado por poder contar com a sua parceria e orientação com vistas à COP30. Agradeço também a todos os delegados, observadores e funcionários do secretariado da UNFCCC que demonstraram dedicação e empenho extraordinários na promoção do nosso trabalho coletivo no âmbito dos Órgãos Subsidiários.
Embora os resultados da SB62 não tenham sido ideais, nosso trabalho coletivo em Bonn tampouco foi ordinário. Nosso processo mostrou que, juntos, conseguimos acelerar os resultados do trabalho entre as sessões dos Órgãos Subsidiários e a posterior consideração formal pela COP, pela Reunião das Partes do Protocolo de Quioto (CMP) e pela Reunião das Partes do Acordo de Paris (CMA). De forma ainda mais importante, a SB62 enviou sinais claros do compromisso inabalável de todas as Partes com o multilateralismo e com o regime de mudança do clima que construímos juntos desde que nossa Convenção foi aberta a assinatura há 33 anos, na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cúpula da Terra), em 1992, no Rio de Janeiro.
Em 2025, a comunidade internacional voltará ao Brasil carregando o peso de uma grande responsabilidade. Em 1992, ninguém poderia imaginar que alcançaríamos tanto – e, ainda assim, nos encontraríamos hoje tão perto de frustrar o objetivo último da Convenção, que é evitar interferência humana perigosa no sistema climático.
A tarefa de honrar o legado que construímos juntos nas sessões anteriores da COP recai sobre os ombros de todos nós – desde a COP1, em Berlim, em 1995, e a COP3, em Kyoto, em 1997, até a COP21, em Paris, em 2015. Agora cabe a nós dar o próximo passo na COP30, após a conclusão histórica do primeiro Balanço Global (GST) sob o Acordo de Paris na COP28, em Dubai, em 2023, e a conclusão na COP29, em Baku, tanto do Livro de Regras de Paris quanto do último mandato de negociação remanescente da COP21 – o Novo Objetivo Coletivo Quantificado sobre financiamento climático (NCQG). É nossa responsabilidade coletiva levar adiante esse legado. Devemos dar o próximo passo na COP30.
A COP30 é um momento para celebrar o décimo aniversário do Acordo de Paris. Ao longo de sua primeira década, o Acordo de Paris demonstrou eficiência e resiliência. O tratado está funcionando. Seu ciclo de ambição e implementação está em pleno movimento. No entanto, o aquecimento global está ocorrendo muito mais rapidamente do que as projeções indicavam em 2015. Ao mesmo tempo, obstáculos geopolíticos e econômicos impõem novos desafios à cooperação internacional, inclusive no âmbito do regime climático.
Guiados pela equidade e pela melhor ciência disponível, devemos agora nos unir para desencadear a próxima onda de ações climáticas ambiciosas. Não temos escolha senão alcançar avanços exponenciais por meio de resultados concretos. A ciência é clara: a capacidade da humanidade de vencer a luta contra a mudança do clima no longo prazo depende das escolhas que fizermos hoje e de como as colocaremos em prática nos próximos cinco anos.
Durante a SB62, realizei consultas com todos os grupos de negociação das Partes. Agradeço seu engajamento, abertura e confiança. Minha equipe e eu estamos genuinamente empenhados em garantir um processo justo, inclusivo, transparente e previsível com vistas à COP30. Com a humildade exigida pela complexidade da tarefa que temos pela frente, continuarei a precisar de sua criatividade para encontrar novas soluções para novos desafios, bem como de sua avaliação constante e honesta de agora até novembro, a fim de moldar os resultados da COP30.
A COP30 não é sobre a Presidência da COP30 nem sobre nossas delegações individualmente. A COP30 diz respeito ao trabalho coletivo que todos precisamos realizar. Diz respeito às gerações presentes e futuras. Como mencionei em minha quinta carta, de 12 de agosto de 2025, a UNFCCC trata, em última análise, de pessoas. São as pessoas que estão em jogo. A minha equipe e eu somos movidos por um forte sentido de propósito que vem de uma compreensão profunda de que a COP30 terá implicações que vão muito além da própria conferência como evento isolado. Convido todos os delegados a se juntarem à Presidência nesse propósito.
Não cabe à Presidência da COP30 “fazer história”. Cabe a todos nós responder à altura do contexto histórico em que vivemos. Como novo guardião do nosso processo, compreendo que todos seremos julgados – agora e no futuro – pelo sucesso que tivermos em honrar e preservar o legado dos nossos antecessores, ao mesmo tempo em que abrimos caminho para sua expansão, das salas de negociação aos gabinetes, conselhos empresariais e lares da população.
A todas as Partes da Convenção, do Protocolo de Quioto e do Acordo de Paris, garanto-lhes que a Presidência da COP30 está determinada a servir de veículo para que a sua vontade se manifeste de forma equilibrada e coerente. A inteligência coletiva e o rigor processual serão resguardados para um processo legítimo e verdadeiramente eficaz, uma vez que vieses e visão de curto prazo podem comprometer a sustentabilidade de nossos resultados no longo prazo.
Ao proteger nosso processo, sob orientação das Partes, permaneço comprometido com a imparcialidade no aumento de nossa ambição coletiva. A humanidade não pode se dar ao luxo de novos atrasos decorrentes de potenciais falhas de confiança e cooperação, uma vez que a COP30 marca precisamente o meio da década que a melhor ciência disponível considera crítica para nossos esforços de limitar o aumento da temperatura a 1,5 °C e, assim, reduzir significativamente os riscos e os impactos da mudança do clima. Cada fração de grau e cada ano acima de 1,5 °C contam para manter vivo o objetivo último da Convenção.
O que ouvimos das Partes na SB62
Na SB62, a Presidência da COP30 ouviu atentamente as Partes, que acreditam que a COP30 deve responder a como nossas contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), em conjunto, prometem efetivamente à humanidade um futuro seguro, próspero e sustentável. Também observei divergências significativas sobre a forma e o escopo da nossa resposta às NDCs e ao relatório-síntese a ser publicado pelo secretariado da UNFCCC em outubro. Essas divergências podem e devem ser superadas, e estou determinado a oferecer todas as condições para um diálogo franco, aberto e criativo com esse fim.
Longe de representar meras metas climáticas para 2035, nossas NDCs representam a visão de nosso futuro comum. Elas são veículos de cooperação que nos permitem realizar essa visão juntos. Se a imagem apresentada pelo conjunto de nossas NDCs se revelar decepcionante, é nossa responsabilidade coletiva convertê-la em um quadro que assegure um planeta habitável, proteja todas as economias e melhore os padrões de vida e as oportunidades para todos os povos e para todas as gerações – uma imagem que deixe nossos filhos orgulhosos, aliviados e esperançosos quanto ao seu próprio futuro.
Ao cruzarmos a marca dos 100 dias antes da COP30, cerca de quatro quintos (4/5) dos membros do Acordo de Paris ainda não apresentaram novas NDCs para 2035. As Partes sabem como é importante que a UNFCCC receba as NDCs a tempo de serem refletidas no relatório de síntese. Nenhuma ação é demonstração mais forte de compromisso com o multilateralismo e com o regime climático do que as NDCs que nossos países apresentam como determinação nacional de contribuir para o Acordo de Paris. Em primeiro lugar, as NDCs são demonstrações do compromisso dos governos com os seus povos. O evento de alto nível a ser organizado pelo Secretário-Geral das Nações Unidas em 24 de setembro de 2025, à margem da 80ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU80), oferecerá uma plataforma importante para que os países que ainda não o fizeram revelem novas metas para 2035 como sua demonstração máxima de apoio à COP30, ao regime multilateral do clima e a um futuro mais próspero.
Na SB62, a Presidência da COP30 realizou consultas juntamente com a Presidência da COP29 sobre o “Mapa do Caminho de Baku a Belém para o 1,3 trilhão”, com o objetivo de aumentar o financiamento climático para as Partes países em desenvolvimento. A Presidência também ouviu as preocupações de muitas Partes quanto à sua capacidade de se engajar em ações climáticas ambiciosas quando há frustrações relacionadas ao financiamento climático e a medidas que afetam o comércio internacional. Além disso, ouvimos expectativas de algumas Partes quanto a sinergias entre clima, biodiversidade, desertificação e desenvolvimento sustentável, bem como à implementação do chamado global por esforços para deter e reverter o desmatamento e a degradação florestal até 2030 e acelerar a transição energética global – incluindo a triplicação da capacidade de energia renovável global, a duplicação da taxa média anual global de melhoria da eficiência energética e a transição para afastamento dos combustíveis fósseis nos sistemas de energia, de forma justa, ordenada e equitativa. Registramos também opiniões de que a COP30 deveria refletir sobre o primeiro ciclo de Relatórios Bienais de Transparência (BTRs), Planos Nacionais de Adaptação (NAPs) e perdas e danos. Assim como no caso das NDCs, essas questões são relevantes, mas nem todas figuram como itens individuais de agenda para discussão em Belém.
Consultas da Presidência da COP30
Para garantir que nosso trabalho em torno dessas questões seja fortemente fundamentado em um processo inclusivo, transparente e previsível, com vistas à COP30, estou lançando imediatamente as “Consultas da Presidência da COP30” no período entre as sessões dos Órgãos Subsidiários, a fim de alcançar avanços que, de outra forma, ficariam para as duas semanas da COP. As consultas no período entre as sessões serão realizadas em coordenação com a Presidência da COP29 e os presidentes dos SBs, que serão fundamentais para o sucesso em Belém. Nas COPs anteriores, as consultas da Presidência provaram ser um modo de trabalho excepcionalmente eficaz para abordar questões de alto perfil político, bem como impasses nas discussões técnicas, garantindo inclusão e transparência. Esperamos que as consultas da Presidência da COP30 ofereçam espaço para que as Partes canalizem prioridades que não estejam atualmente cobertas por itens formais de agenda.
Encorajo as Partes a utilizarem as consultas da Presidência caso considerem necessário levantar questões que não estejam cobertas pelas agendas provisórias da COP30, CMP20, CMA7 e SB63. Essas consultas podem também tratar de itens propostos já adicionados às agendas e para os quais se prevê que seja difícil chegar a um consenso. Devemos todos buscar a adoção ágil das agendas e o suave início dos trabalhos na COP30 e na SB63, e encorajo as Partes a se absterem de introduzir novos itens de agenda potencialmente controversos que possam sobrecarregar ainda mais o processo ou desviar a atenção das prioridades acordadas.
Nossas consultas da Presidência da COP30 começarão nas próximas semanas com uma sessão online com todas as Partes, na qual espero coletar opiniões preliminares sobre a forma e o conteúdo de nossa resposta às NDCs e ao relatório-síntese a ser publicado pelo secretariado da UNFCCC em outubro. Também recolherei opiniões sobre questões adicionais que as Partes acreditem merecer atenção juntamente com a nossa resposta coletiva ao relatório-síntese sobre as NDCs. Informações detalhadas sobre a primeira sessão online das consultas da Presidência no período entre sessões serão comunicadas em breve pelo secretariado. Como muitas Partes salientaram, não pretendemos antecipar o segundo GST nem realizar uma avaliação intermediária. Buscaremos, isto sim, aprimorar a implementação.
Com base nessa troca inicial, realizaremos duas consultas presenciais subsequentes da Presidência da COP30 com todos os grupos negociadores e demais Partes. A primeira ocorrerá em 25 de setembro de 2025, em Nova Iorque, à margem da AGNU80. A segunda será realizada em 15 de outubro, em Brasília, após a Reunião Ministerial de Alto Nível da Pré-COP. Informações relacionadas serão comunicadas pelo secretariado. Sessão online com todas as Partes, observadores admitidos e grupos de organizações junto à UNFCCC será realizada após cada consulta presencial da Presidência da COP30. Solicitamos às Partes que se planejem com antecedência.
Após a sessão online que se seguirá à Pré-COP, as consultas podem continuar em formato virtual no período entre sessões e presencialmente durante a semana antes da SB63, com grupos negociadores e outras Partes, com vistas à adoção ágil das agendas e ao suave início dos trabalhos.
Na COP30, retomarei as consultas da Presidência a partir de 10 de novembro de 2025.
Em paralelo às consultas da Presidência, contarei com pares ministeriais para apoiar com consultas adicionais sobre cinco blocos fundamentais para os resultados da COP30: mitigação, adaptação, meios de implementação, transição justa e GST. Mais informações sobre a designação dos pares ministeriais serão divulgadas em breve.
Num contexto em que a urgência climática interage com desafios geopolíticos e socioeconómicos crescentes, a Presidência da COP30 espera que, de agora até novembro, continuemos a ser guiados por três prioridades interligadas: (1) reforçar o multilateralismo e o regime de mudança do clima no âmbito da UNFCCC; (2) conectar o regime de mudança do clima à vida real das pessoas; e (3) acelerar a implementação do Acordo de Paris, estimulando a ação e os ajustes estruturais em todas as instituições que podem contribuir para isso.
Vamos trabalhar em conjunto, no espírito do Mutirão Global, para garantir que a COP30 seja lembrada como o momento em que o mundo escolheu a unidade em vez da divisão, a ação em vez da procrastinação e o legado em vez da inércia – mudando por escolha, juntos.
André Aranha Correa do Lago
Presidente Designado da COP30