BOLETIM DE RÁDIO COP30 BRASIL

Boletim Especial COP30 Brasil - Mauricio Lyrio: Brasil tem “credenciais únicas” nas negociações climáticas

Em entrevista exclusiva, o embaixador e chefe brasileiro de negociações conta pelo o que o país é reconhecido internacionalmente na área climática. Ele também detalha no que o Brasil pretende avançar para tornar essa a COP da Implementação

Mauricio Lyrio, chefe das negociações do Brasil na COP30, diz que o país tem exemplos sustentáveis reconhecidos internacionalmente e pretende fortalecer o multilateralismo na Conferência - Foto: Rafa Neddermeyer / COP30
Mauricio Lyrio, chefe das negociações do Brasil na COP30, diz que o país tem exemplos sustentáveis reconhecidos internacionalmente e pretende fortalecer o multilateralismo na Conferência - Foto: Rafa Neddermeyer / COP30

Reportagem e locução: Mayara Souto / COP30 

Repórter: Brasil, o país da COP30. A 30ª edição da Conferência das Partes vai acontecer, pela primeira vez, no coração da Amazônia, em Belém, no Pará. Apesar do ineditismo em receber o maior evento sobre mudança do clima do mundo, essa não é a primeira vez que o país é palco de grandes debates climáticos.

Mauricio Lyrio: Bom, eu sou Maurício Lyrio, secretário de clima, energia e meio-ambiente do Ministério das Relações Exteriores e chefe da delegação do Brasil, a delegação negociadora junto a COP30.

O Brasil tem já um papel que eu diria até de liderança nessa área de clima de décadas, porque foi no Brasil, no Rio de Janeiro, em 1992, que nós na verdade conseguimos negociar uma convenção para o combate à mudança do clima. Então essa é a própria origem do sistema internacional de combate à mudança do clima.  

Repórter: A Eco92, ou Rio-92, foi o que deu base para a criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a UNFCCC (na sigla em inglês), que é a responsável pelas COPs. Três décadas atrás o Brasil já liderava o debate da mudança do clima e, agora, pode compartilhar com o mundo exemplos de ações sustentáveis desenvolvidas aqui. 

Mauricio Lyrio: O Brasil tem credenciais únicas em termos de negociação na área climática, mas, além disso, eu diria de políticas públicas e também eu diria de características próprias do Brasil, que contribuem para o combate à mudança do clima. O Brasil fez uma transição energética, no sentido de tornar a sua matriz mais renovável, muito antes da própria discussão sobre combate à mudança do clima. 

Ao mesmo tempo, o Brasil tem esse acervo extraordinário biológico que é um país de cobertura florestal. Mais da metade do território brasileiro é ocupado por florestas nativas, originais. Não só a Floresta Amazônica, mas outras florestas.

Repórter: Atualmente, a matriz elétrica brasileira tem mais de 90% de fontes renováveis, um exemplo mundial. Boa parte delas vem das usinas hidrelétricas, além de outras fontes que utilizam matéria-prima vegetal.  

Mauricio Lyrio: O Brasil tem uma credencial na área de energia que poucos países têm. Por exemplo, já fui embaixador em vários postos no exterior. Em que outro país do mundo você vai a um posto de combustível? Eu não vou nem dizer posto de gasolina, e você pode optar entre botar gasolina ou etanol, que é um combustível renovável. Porque na hora, por exemplo, de plantar cana para produzir etanol, há absorção de carbono. Então, que em que outro país você consegue fazer isso? Não consegue em nenhum outro país. Há mistura de combustíveis renováveis na gasolina em outros países? Há. Mas isso de você poder ter acesso a carros flex como a gente chama, com biocombustíveis já saídos da concessionária, da fábrica ou de uma compra particular, isso não existe em outros países.

Repórter: Com o reconhecimento internacional do esforço brasileiro para enfrentar a mudança do clima, a presidência da COP30 lança um chamado à ação, com foco nos países que mais sofrem os impactos da crise climática. 

Mauricio Lyrio: Nós temos um problema hoje que é a dificuldade dos países de cumprirem efetivamente as suas obrigações em relação ao regime do clima. Então, um interesse do Brasil é fazer um chamado internacional para que a gente possa reengajar os países nesse sentido, de que realmente reduzam as suas emissões. Agora, para isso, a gente precisa do financiamento dos países que mais poluíram. Porque hoje a gente tem um estoque de carbono na atmosfera que vem desde o início da Revolução Industrial. Então, muitos países ricos são ricos hoje porque se desenvolveram com energia barata. Mas, então, eles precisam financiar agora os outros países que terão de se desenvolver com energia renovável que não é tão barata. 

Repórter: O financiamento climático é um dos pontos críticos a serem discutidos durante a Conferência. Por isso, o Brasil iniciou o debate internacional sobre esse assunto ainda no ano passado e deve apresentar na COP30  a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre. A inovação pretende remunerar os países que conservarem suas florestas.

Mauricio Lyrio: Então a COP, de certa maneira, é o coroamento desse processo, porque a gente começou dizendo: "Vamos combater a pobreza e a mudança do clima já a partir da reunião do G20, também no BRICS, e agora na COP”. 

Tanto que a gente criou, por exemplo, no G20, uma força-tarefa específica para a questão de como chegar ao melhor financiamento para o combate à mudança do clima. A gente criou um grupo justamente conciliando a área financeira dos governos com a área ambiental. Então, isso foi o embrião desse processo. E também no BRICS, nós lançamos uma declaração, justamente, para aumentar o financiamento ao combate à mudança do clima. 

Repórter: Para além das finanças, o contexto geopolítico atual deve desafiar a  reconhecida diplomacia brasileira na COP30. Mas, a proposta do Brasil é que esta seja a COP da Implementação.   

Mauricio Lyrio: O mais importante é a sobrevivência do regime de clima, por meio de novas regras, que nós estamos negociando, que são as chamadas negociações mandatadas. Mas aí que está. A gente quer dar um passo além. A ideia é que essa seja uma COP também da implementação das decisões porque desde o Acordo de Paris, que nós já completamos 10 anos, uma série de decisões foram tomadas, mas a gente precisa implementá-las.

E, por exemplo, parte da implementação é o cumprimento do que a gente chama de Compromissos Nacionais para Redução de Emissões (NDC). O Brasil está tão na vanguarda que o Brasil foi um dos poucos países que apresentaram o seu compromisso antes do prazo. O prazo inicial era 10 de fevereiro. Cada país diz: "Ah, eu vou reduzir a emissão de CO2 numa proporção tal". O Brasil fez isso como um número pequeno de países.

Repórter: E a partir desse chamado aos outros países, a presidência da COP30 deseja que as ações sustentáveis se estendam para além da Conferência.

Mauricio Lyrio: A ideia e o governo brasileiro está muito convencido disso, é que combate à mudança do clima, não é simplesmente realizar uma reunião com declarações bonitas, né? O verdadeiro combate à mudança do clima é a mudança inclusive de hábitos no cotidiano das pessoas e dos governos, em termos de políticas públicas, para que isso seja uma atitude permanente e não meramente um tema de uma reunião que depois se esquece no dia seguinte. 

Repórter: Esse foi o boletim especial COP30 sobre como o Brasil lidera os debates do regime climático internacional. Novas edições trarão mais informações sobre o que se espera da COP30 e os temas que devem ser discutidos na Conferência em Belém.

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